Parece uma afirmação escandalosa, mas é algo que afirmo com grande convicção: The Good Place, apesar de não ser uma série perfeita, entregou um dos finais mais satisfatórios da televisão. Para os que ainda não viram a series finale, o artigo será dividido em uma parte sem spoilers e com spoilers. Àqueles que chegaram a este artigo sem conhecer a série, tentarei resumir a proposta em poucas palavras a seguir. 

The Good Place se passa em um Além fictício, baseado na dicotomia comum de que se você foi uma pessoa boa irá para o “lugar bom” e se você foi uma pessoa ruim irá para o “lugar ruim”. O caráter único da série começa quando acompanhamos nossa protagonista Eleanor Shellstrop, interpretada por Kristen Bell, chegando ao “lugar bom” por acidente. A partir desse ponto, Eleanor passa a ter que esconder a verdade para continuar  no paraíso, rendendo várias tramas dramáticas e engraçadas que se desenvolvem ao longo das quatro temporadas. E claro, termina com louvor.

Michael (Ted Danson) e Eleanor (Kristen Bell)

A arte de saber onde parar (sem spoilers)

Grande parte da genialidade do final de The Good Place vem do fato de que a série teve um planejamento intricado. O criador Michael Schur, já renomado por seu trabalho em Parks and Recreation e Brooklyn Nine-Nine, conseguiu organizar a história para que ela não se estendesse além do necessário, provando que nem sempre mais é melhor.

Por conta deste planejamento, o final de The Good Place resolve todos os fios soltos das tramas, dando atenção até mesmo para os personagens secundários e coadjuvantes. E claro, o sexteto principal recebe atenção especial dos escritores, recebendo momentos únicos que amarram seus desenvolvimentos pessoais com um belo laço.

A série também continua trazendo lições filosóficas até o último momento, cumprindo as palavras do criador Michael Schur de que a série não era sobre salvação religiosa e sim sobre versões de comportamento ético. Não importa sua crença, o desenvolvimento e conclusão da série te farão pensar.

Fechando o círculo (com spoilers)

O final certamente foi impactante, tendo o poder de surpreender até mesmo aqueles já esperavam que esse seria o rumo da série. Quando Eleanor finalmente passa pelo portal, como uma onda voltando para o mar, é impossível não parar e refletir sobre a nossa própria mortalidade e os mistérios do além vida. Mas não é isso que torna o final de The Good Place tão perfeito, mas sim o fato de que ele completa um círculo perfeitamente – ou um Jeremy Bearimy, se preferir.

No primeiro episódio, somos apresentados aos personagens da seguinte forma: Eleanor, uma pessoa gentil que ajuda pessoas fazendo trabalhos de caridade; Chidi, o sábio filósofo moral que quer melhorar o mundo com seu conhecimento; Jason, apresentado como Jianju, o monge; Tahani, a celebridade altruísta que faz de tudo para ajudar os outros; Micheal, um arquiteto que projetou um bairro do “lugar bom” e tinha uma obsessão com coisas humanas; e Janet, uma não-robô não-garota que sabe de literalmente tudo.

Sabemos que no desenvolver da trama, essas apresentações iniciais são desafiadas e completamente desconstruídas, revelando a quantidade de crescimento que cada personagem ainda necessita. Dentre os diversos dilemas morais, a série também passa várias mensagens enquanto vemos os personagens evoluindo. Dentre estes, alguns se destacam no desenrolar do final.

As pessoas melhoram quando recebem amor e apoio externos. Optamos por ser bons por causa de nossos laços com outras pessoas. O que importa não é se as pessoas são boas ou más, e sim se elas estão tentando ser melhores hoje do que eram ontem. O que dá sentido à vida é o fato de que ela termina. E uma última mensagem mais sutil, a de que o verdadeiro “lugar bom” não precisa ser um lugar, e sim apenas ter tempo suficiente com as pessoas que você ama.

Eleanor, Chidi, Michael e Janet

E claro, vemos como essas lições se aplicam comparando onde nosso elenco principal termina. Eleanor realmente revela-se como uma pessoa gentil e acaba fazendo o maior trabalho de caridade do mundo, salvando todas as almas do universo. Chidi literalmente usa seu conhecimento filosófico e moral para melhorar o além-vida. Jason atinge a paz espiritual de um monge. Tahani decide dedicar o resto da eternidade ajudando os outros. Micheal literalmente vira um arquiteto do “lugar bom” e eventualmente realiza seu sonho de entender a humanidade verdadeiramente. Janet, que apesar de continuar tendo todo o conhecimento do universo, admite em sua última fala que ainda existem mistérios que nem mesmo ela consegue desvendar. E aqui reside um dos pontos mais fortes do final, essa circularidade inevitável dos personagens.

Em uma era de finais decepcionantes e apressados e críticas cruéis nas redes sociais, The Good Place entregou a alegria e a esperança que todos precisávamos desesperadamente em suas series finale. A maior expectativa é que a série se torne um marco da televisão, sendo lembrado nas próximas gerações como marcos da comédia tal como “Friends“. E claro, mal podemos esperar para ver o que os envolvidos farão a seguir.