Originado no clássico RPG de mesa, Cyberpunk 2077 ganhou um game pelas mãos da CD Projekt Red e se expandiu para outras mídias, como quadrinhos, board games e animações. Em agosto de 2023, a editora Rocco publicou no Brasil o livro Cyberpunk 2077: Nenhum Acaso, escrito pelo polonês Rafał Kosik, que revisita este universo e apresenta personagens que crescem ao longo de uma trama que, embora familiar para os fãs, ainda explora as principais características desse futuro sombrio e distópico de forma criativa.

Como é comum no gênero cyberpunk, o contraste entre a alta tecnologia e a baixa qualidade de vida é um tema central. O enredo se passa em uma época em que as pessoas podem substituir partes orgânicas do corpo por membros mecânicos, onde a aparência se sobrepõe à essência. Grandes corporações e gangues dominam o poder, subjugando a população à servidão por meio do medo e da criação de falsas necessidades. Esses elementos trazem simbolismos claros: nesta realidade, o dinheiro e a violência ditam as regras.

Diante desse cenário, Cyberpunk 2077: Nenhum Acaso nos apresenta um grupo de protagonistas provenientes de diferentes contextos sociais de Night City. Os personagens principais incluem Zor, Aya, Milena, Albert e Ron. Zor é um ex-soldado que perdeu sua família nas guerras corporativas e agora vive de subempregos em um pequeno apartamento. Aya grava neurodanças e realiza missões para um contratante misterioso. Ron, outrora um grande nome em sua área, agora trabalha como *medicânico em uma clínica suspeita. Albert, um jovem que mora com sua mãe, atua como trilha-rede, enquanto Milena é uma ambiciosa corporativa envolvida em negociações de alto nível.

Logo no primeiro capítulo, somos apresentados de maneira superficial a esses personagens, em meio a uma ação frenética. Sem se conhecerem, todos são contratados para roubar uma carga misteriosa da corporação Militech. O assalto enfrenta algumas complicações, mas termina de forma bem-sucedida: ninguém morre, eles não são traídos pelo contratante, e recebem o pagamento combinado. A partir desse ponto, cada um segue seu caminho.

A história, embora possa parecer previsível para quem já conhece o universo, se desenvolve de maneira envolvente. Novos encontros entre os personagens acontecem por diferentes motivos, e a escrita dinâmica, repleta de ação, mantém o leitor preso à narrativa. Entre socos e tiroteios, há muitos momentos que focam no desenvolvimento dos personagens, revelando mais sobre suas motivações e personalidades de forma estruturada.

Com cerca de 400 páginas divididas em 12 capítulos, o livro alterna entre os personagens em um mesmo capítulo, sem transições explícitas. Por exemplo, em um parágrafo estamos com Zor em seu trabalho como dedetizador, e logo depois a narrativa já nos coloca na vida de Aya, em uma de suas gravações, sem subtítulos que indiquem essa troca. O autor utiliza essa técnica para criar uma sensação de paralelismo entre as ações, o que é interessante, pois cada personagem tem ambientes e situações distintamente caracterizados.

Essa escolha narrativa também permite que conheçamos melhor os personagens em suas rotinas, pensamentos e frustrações, o que os torna mais interessantes e coerentes em suas ações ao longo da história.

Cyberpunk 2077: Nenhum Acaso demonstra que este universo tem muito a ser explorado. Destacando os aspectos contraditórios da sociedade e capturando a essência do gênero, o livro apresenta os conceitos fundamentais de maneira que não cansa os leitores familiarizados com o tema, ao mesmo tempo que não afasta os iniciantes. Assim, torna-se uma leitura indicada tanto para fãs quanto para curiosos, oferecendo não apenas entretenimento, mas também uma reflexão sobre uma distopia que, em muitos aspectos, não está tão distante da nossa realidade.

Glossário:

Medicânico: médico especializado no implante e manutenção dos equipamentos